“Tem boi na linha”

Victor Osório
5 min readJan 5, 2021

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Tem boi na linha é uma expressão muito antiga. Talvez alguns dos leitores nem conseguem imaginar o que é uma linha, somente quem tem mais de 35 anos sabe o que é uma linha telefônica, como era difícil de conseguir e que as vezes acontecia um problema chamado de “linha cruzada”.

O que acontecia… As vezes você estava no meio de uma ligação e aparecia mais dois indivíduos conversando. Esse erro não acontece mais, saímos do Circuit Switching e agora estamos na era do Package Switching. Em raríssimas vezes esse erro causava problemas, ou porque teríamos nossos segredos revelados, ou porque as pessoas simplesmente não percebiam que o interlocutor tinha mudado.

E foi esse meu sentimento ao ler A Mente Moralista de Jonathan Haidt. Na verdade já tinha tendo essa impressão anteriormente, mas culpabilizava apenas as Redes Sociais. Elas não são inocentes, muito pelo contrário, são elas quem potencializam os efeitos do que esse livro trata.

Antes de começar, quero afirmar que o nome do livro é péssimo! O nome original é The Righteous Mind: Why Good People Are Divided by Politics and Religion. Vale lembrar que ele não está falando da Direita, está falando de correto. Nossa mente sempre nos dará a impressão que nós estamos correto e os outros errado.

Meu intuito lendo esse livro é apenas entender por que não podemos todos nos dar bem? E essa é a frase inicial do livro. O autor tenta construir também suas teorias sobre o assunto, mas ele usou o método científico para isso. Ele construiu experimentos e tentou provar suas teorias. Ao contrário de muitos, ele foi aberto a questionar a suas próprias crenças ao fazer esses experimentos, não tentando apenas reforçar suas crenças através de argumentos, mas colocar elas a prova para ver se realmente são verdadeiras.

De onde vem a moralidade?

— Você deve crer na mesma coisa que eu creio.

Esse é o pressuposto básico de 99,9999% das discussões da internet. “Isso é óbvio!” talvez seja a frase mais dita no Twitter. Segundo meu próprio instituo de pesquisas que não se importa com nenhum método científico.

Logo o autor tenta fazer uma árvore genealógica de onde vem seus conceitos e suas experiências. Será que você crer naquilo que eu creio. Ele parte de dois pressupostos:

  • A moralidade é inata
  • A moralidade é ensinada

E sabe o que a conclusão? Nenhuma das duas! Segundo os estudos, temos uma certa moralidade inata. Como um roteiro para uma peça de teatro, que pode vir da Psicologia Evolutiva ou mesmo da Genética. E nem ao menos abraçamos a moralidade que nos é ensinada de graça. Ao contrário, nós construímos nossa moralidade a partir das nossas experiências.

Muito provavelmente o menino liberal que crê que se alguém trabalhar muito terá sucesso, nunca sofreu preconceito na vida, sendo assim nunca teve suas oportunidades desperdiçadas por decisões impensadas de outros.

Muito provavelmente o cara da periferia que ralou pra caramba e crê que todo Classe Média é FDP, já topou com muitos indivíduos Classe Média FDP.

Eles creem que seus julgamentos últimos são A Verdade.

Mas o que isso significa? Significa que não devemos tratar os outros como hipócritas! Eles estão sendo sinceros dentro da sua experiência de vida limitada, assim como você está sendo sincero dentro da sua experiência vida limitada. E eu, escrevendo isso, estou sendo sincero dentro da minha experiência de vida limitada. Todos nós temos uma experiência de vida limitada por não conhecer plenamente o outro.

O que controla nossas decisões?

— Todos os meus movimentos são friamente calculados.

Outra pergunta que ele tenta responder é de onde vem nossos julgamentos morais? Existem algumas suspeitas:

  • Eles são puramente racionais
  • Eles são puramente emocionais

E ele descobre que nem um nem outro. As emoções são como um Elefante, ele ainda coloca um elefante por ser um ser gigante, eu colocaria um Olifante, pois creio que o autor preferiria um animal maior ainda. E a razão é o Ginete que o comanda. A razão até tem controle, mas as emoções podem se descontrolar quando desejarem.

Ao continuar com sua investigação ele ainda encontrou outro mecanismo. Nós irracionalmente escolhemos no que crer e até inventamos crenças baseadas em nossa emoção.

Imagina nosso amigo liberal que crer que não pode haver empresas privadas porque todas as empresas são boas e o governo é ruim. Você pode listar todos os artigos que falam sobre o assunto, ele vai ler só os qual ele concorda. Irracionalmente ele não ler argumentos que criticam sua posição.

E se você criar situações hipotéticas que minem todas as “desculpas”, caso você tenha a infelicidade de usar a “palavra chave”, ele ainda inventará outras desculpas… Algumas esdrúxulas!

Viu termo “palavra chave”? Pois é, sabia que temos algumas palavras chaves que acabam por nos direcionar a algumas opiniões? Imagina usar Reforma Agrária para falar da Política de Terras do governo americano nos anos 40? Seria taxado de comunista em menos de 1s.

Como discutir com um Fascista?

— Os livros hoje em dia, como regra, é um amontoado… Muita coisa escrita, tem que suavizar aquilo.

Isso pode ser uma das possíveis conclusões da minha leitura inicial. Eu não terminei a leitura ainda, pode ser que tenha mais. Mas precisamos repensar a forma de discutir. Precisamos entender o outro, achar a chave do entendimento dele. Precisamos estar também abertos ao debate, colocar nossas crenças em jogo.

Eu creio que o que eu creio é sólido por isso eu aceito ser questionado de qualquer crença que eu tenha. E creio que muitas crenças não básicas serão colocadas de lados com uma seria discussão.

Esse foi apenas uma pequena reflexão sobre o inicio da leitura de um livro.

PS.: Depois refleti um pouco e isso pode gerar um pouco de confusão. Fascismo é uma coisas, mas nem todo mundo taxado de Fascista é realmente Fascista. Eu mesmo já fui taxado de Fascista no Facebook por não emitir uma opinião sobre algo que aconteceu e eu nem ao menos sabia. Esse foi o estopim para abandonar aquela rede. Era Junho 2018.

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Victor Osório

Senior Software Engineer@Openet | Java | Software Architect | Technology | Society