Encontrando minha comunidade
Porque?
Sou um tipo de expatriado há pelo menos 18 anos.
Não aquele tipo que as pessoas percebem, mas aquele tipo que só você percebe. Vivo em Campinas, interior de São Paulo desde 2002. Não tenho mais o sotaque da minha terra, mas também não tenho o sotaque de onde moro.
Mantenho uma cultura própria, que surgiu da cultura teresinense (curiosidade, o corretor conhece o gentílico de inúmeras cidades, mas pede pra eu corrigir o de quem nasceu em Teresina) de 2001 misturada com inúmeras influências que a vida me trouxe. E são muitas, pois morei 13 anos em republicas estudantis (e de pós estudantes) com pessoas de todas as regiões do Brasil.
Nunca consegui me introduzir na sociedade campineira. Se contar tenho creio que uns 2 casais amigos que são efetivamente daqui. Até que minha esposa levantou o questionamento: será que você não é aceito porque simplesmente não é daqui?
Creio que essa é a realidade de muitos nordestinos no interior de São Paulo. Lugar que é um pouco cruel conosco. Você pode dizer que não, mas temos que constantemente ouvir coisas como:
- Nossa, mas você passou em uma universidade pública?
- Mas você não parece nordestino?
- Mas você é até inteligente?
- Etc…
Sim. Existe um perfil imaginário de nordestino na cabeça das pessoas. Um deles é a imagem de um pedreiro baiano negro, outro é o porteiro paraibano e por fim é o garçom piauiense de Pedro II. Todos são pessoas honestas que vieram tentar a sorte por aqui, mas esse não é o perfil de quem veio para uma oportunidade. Muitos de nós não saímos porque precisávamos, saímos porque queremos alçar voos mais altos.
Simplesmente não encaixa na cabeça de algumas dessas pessoas que você, vindo de uma região totalmente desconhecida pra eles, possa ser inteligente ou desenvolver software. E, se o básico não encaixa, como você acha que as oportunidades surgirão?
Você crê que um preconceituoso que acha que Teresina é na praia, ou que você faz xixi na caixa de areia porque não tem água lá, vá te chamar pra alguma boa oportunidade? Eu passei anos procurando ser aceito.
(Sério, isso foi uma piada que um amigo fez a uma pergunta estúpida que eu recebi. Vou contar no final)
Pra que?
Partindo dessa inquietação e vendo as relações de algumas comunidades, resolvi criar uma comunidade para tal. Não tenho intenção de ser Community Manager, logo toda ajuda é bem vinda, inclusive se alguém disser que já existe tal comunidade!
Mas creio que rede de apoio e diálogos são bem vindas, principalmente quando nosso problemas não são compreendidos por quem nunca viveu algo parecido.
Como?
Por isso, copiando alguns grupos já bem conhecidos, criei um grupo no discord. (O nome é provisório)
Link removido, não se administrar comunidades. Interagi com algumas pessoas, mas chega.
Se tem algum interesse em dialogar, entra lá. Essa ideia é embrionária.
Lá tenho em mente como isso vai funcionar. Esse é o lugar do debate por enquanto. Depois podemos ver o que fazer.
- Será que podemos criar redes de apoio?
- Será que podemos dar exemplos de como o preconceito acontece?
Piada estúpida
— Nossa você veio do Piauí! Me disseram que não chove lá.
Antes de eu responder um amigo tomou a frente:
— Sim, eles usam caixa de areia lá pra fazer xixi.
— Sério!?!?! — Sim, a pessoa acreditou! 😖
Situação Constrangedora (2)
Vim morar em Campinas em 02/03/2002. O prefeito da cidade foi assassinado em um crime estranho e nunca investigado decentemente em 10/09/2001. Então quando tenho o primeiro contato com um veterano.
— Ah você é de Teresina?! Sempre quis conhecer alguém de lá! Parece que lá é meio faroeste, né? Lá se morre por qualquer coisa né? Lá todo político deve morrer antes de sair do cargo, não?
(Silêncio constrangedor)…
Situação Constrangedora (3)
Trabalhei com uma grande multinacional, fui contratada para um projeto com ela. Todos os funcionários eram promovidos pelo cliente. No primeiro dia de trabalho, uma líder técnica me fala:
— Você até pode participar das reuniões, mas não fala nada. Seu inglês é muito ruim.
Se o Homem Legenda do Adão Iturrusgarai estivesse presente ele falaria:
— Cala a boca porque não gosto do seu sotaque.