A Sociedade Tecnológica — Técnicas (V)
Essa é a continuação do resumo do segundo capitulo de The Technological Society de Jacques Ellul.
Desenvolvimento Histórico
Cristianismo e Técnica
As influências de uma religião sobre a Técnica podem ser controversas. De um lado temos as influências dos dogmas, da teologia e de outro o seu entendimento e sua aplicação prática. Tentar entender como as pessoas aplicam a técnica a luz da sua teologia é um empreendimento complicado, pois isso pode ser injusto com a própria teologia de um povo. Melhor é apenas observar como elas usam a técnica.
Ocidente e Oriente usavam a técnica de modos completamente diferentes, e nesse momento da história, o ocidente era cristão e o oriente uma mescla de islã e budismo. O ocidente era ativo, conquistador e transformava a natureza em lucro, enquanto o oriente era passivo, fatalista e desdenhava da vida e da ação.
O cristianismo na Rússia tinha conotações orientais, era desapegado da vida material, não direcionado pela técnica e não tinha interesse em exploração de recursos.
No ocidente, a Grécia, em seu declínio, iniciou um empreendimento técnico. Chegou a utilizar largamente técnicas de refino de ouro e prata, uso do vidro, construção naval, cerâmica e a desenvolver armas.
Na decadência do império romano, todas as áreas do império foram afetadas pelo crescimento do números de cristãos. Ruíram a sua organização interna, indústria e os transportes. Os cristãos eram culpados por essa ruína, tanto que Agostinho vai em defesa afirmando que os cristãos eram bons cidadãos. Eles podiam ser bons cidadãos, mas se o foco da vida não fosse a praticidade e o estado, podemos afirmar que sim, eles contribuíram para a ruína de Roma.
Mas a que os historiadores creditam essa apatia dos cristãos com a técnica? A visão de que a natureza era dom de Deus e que devia ser bem utilizada? Certamente não! A natureza do homem medieval era acapitalista e também atécnica.
A idade média, do ponto de vista organizacional, era uma anarquia (no sentido etimológico da palavra). Não havia organização social e política baseada na razão e com regras elaboradas. O empreendimento técnico era inexistente em todas as áreas, desde agricultura até a guerra. As batalhas era reduzida as técnicas mais elementares. E a arquitetura teve pouco avanço técnico.
A técnica na agricultura pouco avançou até o século XII quando um movimento técnico começou a ganhar corpo. Mas esse movimento vinha por influência do oriente através das cruzadas.
Existe o argumento que o cristianismo cria as bases de um movimento técnico. Ao suprimir a escravidão e libertar o homem, há a necessidade de tornar a vida do trabalhador melhor, abrindo espaço para a evolução da técnica. Em todos os locais, a escravidão era uma oposição ao avanço técnico. Outro impedimento do avanço técnico é o medo santo da natureza, “como vamos tocar a terra dos antigos deuses?” O cristianismo dessacraliza a natureza, a natureza é apenas a natureza.
Mas esses dois argumentos não acurácia. Vemos um grande avanço técnico em lugares que usaram largamente a escravidão como o Egito e Roma. Quando Roma liberta seus escravizados, não há nenhum avanço técnico considerável por quase sete séculos. O escravizado era propriedade do seu senhor e contado como patrimônio, assim como sua força de trabalho. Toda técnica que aumentasse o seu potencial, seria deseja pelo seu senhor. Ao contrário, se ninguém explora a a força de trabalho do homem livre, não há vantagem no aumento da sua produtividade.
O outro argumento também não é tão aplicável. Pois uma natureza repleta de deuses com suas vontades e poderes pode ajudar no empreendimento técnico. Essa é a essência da magia, onde as forças da natureza são usadas para o empreendimento técnico.
E qual era doutrina cristã para com a atividade prática? No plano moral, o cristianismo condenava a luxuria e o dinheiro. Tudo que representava as antigas cidades era consagrados a Satã, em oposição a cidade de Deus.
No plano teológico, havia um grande questionamento: é correto? Isso era um grande impeditivo ao avanço técnico. Toda e qualquer invenção deveria passar por esse crivo. É correto usar moinhos de vento? Também existia a ideia de que o mundo ia acabar logo, Jesus estava para voltar. Porque avançarmos e acumular riquezas se tudo isso ia ter um fim?
A reforma deu um fim a maioria desses argumentos.
O Século XIV
No século XIV vemos uma escassez de invenções. Apesar de ser conhecido como um século de muito avanço, todo esse avanço se baseia em técnicas desenvolvidas no século anterior. O século XV foi rico em avanços armamentistas, na indústria náutica, a impressa e no sistema bancário. Tudo isso catapultou as mudanças que ocorreram no mundo durante o século seguinte. Mas o que causou essa falha na evolução técnica?
A primeira característica comum aos livros científicos do século XIV, são a sua falta de ordenação lógica. Praticamente todos os escritos não tinham um plano claro, mas eram apenas um escrita cheias de reflexões e experiências pessoais seguindo o gosto do autor.
A segunda característica é que os livros tentavam abordar os temas por todas as perspectivas possíveis. Não é raro encontrar no mesmo livro arqueologia, teologia, psicologia e história. Isso era um reflexo da expansão do humanismo, faltava especialização. Muitos se propunha a estudar todos os temas e continuavam ignorantes em todos os temas.
Qualquer autor tinha que ser universalista, e com isso eles não conseguiam seguir com uma investigação técnica. A aplicação do tema de estudo era menos importante do que a investigação de todos as causas relacionadas ao tema.
Outra característica era a ausência de ferramentas para leitura. Os livros escritos nessa era não eram feitos para serem consultados, mas para serem lidos por completo pacientemente. Era fruto da ideia de universalismo presente na época.
A Revolução Industrial
O termo revolução industrial é aplicado ao desenvolvimento das máquinas. Lewis Mumford descreve ela como a mudança nos modos de extração de energia, migrando da energia hidráulica para o carvão e a eletricidade. Mas sua tese não é válida porque não houveram só mudanças nas máquinas. Para Norbert Wiener, ela consistiu na substituição do músculo humano, preparando terreno para substituição do cérebro humano.
A revolução industrial é um estado que é consciente de si mesmo, com desenvolvimento da técnica administrativa, militares e da força policial. O principio de Descarte foi aplicado em todos os cantos da filosofia e da ciência, dando um grande avança a técnica na sociedade. Os antigos privilégios foram extintos por Napoleão, mudando o sistema judiciário da Europa e criando um novo espaço para a técnica.
O século XVIII criou um bom ambiente para o desenvolvimento da técnica, o medo do mau desapareceu e as pessoas começaram a ter uma consciência científica.
Mas foi no século XIX que a Europa passou por uma expansão nunca visto. A expansão da técnica foi um fenômeno exclusivamente europeu, que levou as pessoas a acreditarem que o progresso era continuo e iria levar o mundo (leia-se Europa) a um período de paz e prosperidade. Mas esse período foi baseado em cinco fenômenos:
- Um período de longa expansão da técnica.
- Expansão populacional.
- Ambiente econômico favorável (colonialismo).
- Exploração social.
- Claras intenções técnicas
Depois da Revolução Francesa o estado despertou para o controle da técnica. O governo de Napoleão foi muito importante para o desenvolvimento de técnicas jurídicas e econômicas. Isso impulsionou o fortalecimento da burguesia que depois tomou o controle da técnica para desenvolvimento industrial. Mas a burguesia querendo o controle da técnica limitou as grandes escolas para si mesmo.